OS MALABARISTAS




E passava das 22 horas, e Fernando não chegava em casa.  Chovia muito e Paola esperava-o ansiosa, vez por outra olhava a janela na esperança de vê-lo aproximar-se. Estavam no Brasil há um ano e todos os dias enfrentavam a alegria de estarem sobrevivendo junto com a tristeza de só sobreviver. Trabalhar no que gosta não é para todos, mas apesar do malabarismo ser a vocação e o sonho de um sucesso, não trazia muito resultado nos últimos meses. Quando chegaram em São Paulo, Fernando sempre falava a Paola sobre o sonho do circo que iriam ter. Ela visualizava entusiasmada cada espetáculo. Cada hora que seus pinos suavemente sairiam de suas mãos delicadas e subiriam, e voltariam, e mais uma vez firmemente ela seguraria. Agora o rio dos sonhos de Fernando parou, ele anda meio preocupado e a lida tem o feito desanimado. Paola preocupa-se com a situação, mas não desiste incentiva-o e, junto com ele, enfrenta dia a dia o trânsito paulista. Os dois são jovens, ele é firme e guerreia com a própria sorte. Paola, apesar de já demonstrar cansaço e reflexo do sofrimento no seu corpo magro, tem ternura no olhar, como quem não desiste de um sonho, como se o Sol que queimasse sua pele pelas manhãs lhe desse também o brilho que precisava para seguir. O equilíbrio com os pinos que dava-lhes o sustento diário era o mesmo que fazia com que os sonhos ainda vibrassem feito canções de vitória dentro do peito. Certo dia, ao lancharem numa lanchonete perto do sinaleiro onde costumavam trabalhar, Fernando preocupou-se em salientar a Paola que consumisse o mais barato, entendendo, fez o que o marido pedira, mas a vida é cheia de vai e vem, e cheia de surpresas. Um homem, que observava os malabaristas, responsabilizou-se pela conta. Paola suspirou, falando, “Veja, Deus sabe o que faz, ele ajuda.” Ao sair de casa, das suas raízes, ela levava consigo a esperança de vida ao lado da sua vida encontrada em Fernando. Não arrependeu-se, lutava pelo amor que tinha a ele e pelo amor que tinha por si, pelo o amor de ambos. O amor que fazia Fernando trabalhar desde as seis da manhã, ajudando a descarregar caminhões para compensar a semana que não foi fácil. Finalmente, ele chega, os olhos estão cansados, mas sorri, animado com o dinheiro que traz no bolso. ”Tudo, tudo melhora, amor, desde que tenhamos fé.” Paola concorda, ”tenho fé, temos fé, e nossa filha ainda por nascer terá fé!” Nesse momento, Fernando abaixa-se e beija ternamente a barriga da amada. “Abençoada seja nossa filha, Teresa Cristina. E amanhã você vai ouvir dentro do nosso circo o nome dela ser chamado como a malabarista mais bem vista em todo o país e ela voará carregando estrelas, e sentirá a felicidade em seu peito.” Os olhos de Paola soltam um sorriso que não é só sorriso, é uma elevação de espírito de luz. Os dois sentam-se à mesa, jantam a sopa feita por Paola e, logo depois, Fernando pega uma bolsa pequena onde costuma guardar as moedas que ganha no dia, espalha-as na mesa e, juntos, começam a somar, ansiosos para que a soma chegue ao preço do aluguel. E entre aquelas moedas, Fernando para, segura a mão de Paola que repetidas vezes separa as moedas de cinquenta centavos, olha-a nos olhos e diz, “Eu te amo!” E os dois continuam o repetido movimento, assim como repetidas vezes erguem ao alto seus pinos mágicos que lhe dão o sustento e, vez por outra, olham-se e sorriem. E a noite passa e deitam-se com as pernas entrelaçadas, e, juntos pela manhã, colocam sua armadura e seu escudo e vão, sem saber ao certo o que encontrar, sem saber ao certo que retorno terão. E os carros passam, e o sinal fazem-nos parar, eles mostram o seu dom, doado pelo maior de todos os autores, o autor da vida e, entre os movimentos verticais, ao levantar seus olhos para o alto, Fernando vê os céus, sorri e, como se aqueles segundos parassem, vê o Sol brilhando, as nuvens batendo palmas e o céu tão azul, e, agora mais azul que todos os dias, mostrando que vale a pena sonhar, que vale a pena lutar.










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