DEZ FILHOS


TRECHO DO CONTO
DEZ FILHOS
(...)
Manuel tinha dez filhos, dez filhos! E ainda diziam que terá o próximo e Manuel, ele com o ar garboso dizia : Eu faço ! Mas , era cheia a casa, um corredor e vários quartos e a esposa , coitada , não tomava comprimido.
"Não posso, fico doente"
E ia parindo e os filhos se perdendo entre os corredores. Manuel , já nem sabia quem era um nem outro. Apenas gritava : " Vem cá menino".
E vinham um, dois, três.
"Vai comprar feijão, um quilo de feijão e frango , que é mais barato."
Era hora que os meninos , corriam na rua satisfeitos. Porque Manuel, não sabia o nome de cor de nenhum, mas na hora que contava , tinha que ter os dez.
Dez filhos, e a esposa inerte e muda. Nem apelo fazia , apenas aceitava ser como era . Como uma dívida no tempo. Nem sorria , nem chorava. Só esperava o próximo. O próximo filho e ela nem sabia dá amor. Amor que também nunca teve. Mas sentia, sentia um aperto no peito de não saber como parar.
Tinha quatorze anos quando casou, foi cedida pelo pai para Manuel. Não tinha sonhos, senão o de ter uma casa e filhos e esse conseguiu. Mas não aprendeu a sorrir e quando encontrava alguém disposto a conversar, dava um riso tímido, contido , mas os olhos brilhavam.
Gostava de ouvir histórias , gostava de como Manuel contava os casos, que as vezes nem aconteceram. Mas ele contava animado com uma verdade invejável, verdade que ele criava e repetia mil vezes e ela sorria num instante feliz. Não sabia ser assim, falante como ele , é que a vida lhe pôs triste. Triste e conformada.
Vivia como se não pudesse nada fazer, achava as letras lindas , mas não sabia ler. Não aprendeu a juntar as sílabas e admirava quem tinha estudado. Quem pegava um livro e dizia : Vou ler.
A filha mais velha Ana Quitéria , vivia com o livro debaixo do braço e as vezes lia pra ela e era como se tudo se transformasse. Lia enquanto a mãe fazia o arroz numa panela grande. Fazia um quilo de arroz , pra não faltar . Porque eram dez e comiam bem... Ana Quitéria lia com atenção e dizia pra mãe.
"nunca vou ser assim, ter dez filhos "
A mãe olhava com um sorriso de lado.
"Vou estudar e ser farmacêutica"
Os irmãos mais novos , riam e saiam a imitar a irmã . Que gritava com eles correndo atras de um de outro que se perdia nos corredores.
No primeiro quarto , estava Ana Lúcia a filha do meio. Nada queria com nada . Além de fugir da escola para namorar.
" Essa vai ser que nem a mãe. Reclamava Ana Lúcia.
Vai casar e ter dez filhos , se não cuidar."
Certa vez vez , Ana Lúcia fugiu da aula e foi passear com dois meninos da sala . Ficou a andar nas ruas , entrando e saindo de supermercados, perambulando nas praças e mãe que nada sabia , se assustou quando os irmãos chegaram em casa, sem Ana Lúcia. Nesse dia , teve que sair atras e a encontrou no meio da vila com os dois meninos . Dessa vez não teve perdão foi a levando pelo cabelo e lhe surrando.
"O que você pensa da vida ? Quer engravidar com 14 anos? Você vai passar fome se for se amigar com esses moleques. Deixa seu pai saber"
Ana Lúcia , nem se importava . Se trancou no quarto com raiva e ainda disse. " Eu fujo, fujo de novo."
Dessa vez o pai não soube , mas conhecia bem o gênio dela . Sempre a fugir das obrigações e nem ajudar em casa queria.
Manuel fazia de tudo um pouco e agora estava ocupado em uma garagem que resolveu reformar . E dia e noite estava lá , ocupado com sua garagem e toda hora gritava pelos filhos , que vinham correndo pelos corredores, sem saber direito quem ele queria.
Mas ele dizia : Vem cá menino !
E vinha a mulher e vinha , os dez filhos...
O primeiro que chegava era ...
(...)
Lene Dantas.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

UM ADEUS A LUA

O LABRADOR