CIRANDA
Na ciranda, escapulia suas
mãos das mãos.
Escapulia quando mais
desejava, quando mais precisava.
E tudo o que queria... E tudo
o que quer é:
Alguém que segure sua mão.
Alguém que a ache alguém.
Nem o tempo resolveu suas
questões. Tinha desejos alheios a ela própria o tempo todo falava de si pra si,
como se o mundo não fosse além dali, não fosse além do seu quintal com todas
aquelas roupas mal penduradas, levadas de um lado para o outro com o vento.
Ontem foi ao centro e sentiu-se apaixonada pela fivela da sandália que virou
sua gula, por um instante sentiu-se escrava como se a sandália a comprasse,
como se mais tarde a sandália que fosse calça-la, como se ela pudesse entre
outras coisas ter o brilho daquela pequena fivela prateada que destacava mais
ainda a beleza da sandália. “De repente meu pé podia caber ali, mas ali não
cabe meu próprio mundo”. Ali não cabem
suas crises, nem seu amor que partiu e a partiu ao meio, no dia que decidiu
deixá-la, sem nem ao menos avisar-lhe. Ali não cabiam seus dias de infância
quando corria para alcançar os outros e sorria ao encontrá-los em momentos de
farta felicidade. Mas na ciranda, na ciranda sempre se perdia nas mãos, quando todos
ao mesmo tempo encontravam-se ,quando as mãos abraçavam-se. Mas ela não
encontrava e nem se encontrava. Estava o
tempo todo e não estava. Esperou o amor
no caminho de volta para casa, mas esse amor não veio. Nunca o encontrou,
nunca. Por mais que buscasse e esperasse,
não conseguia alcançá-lo e ainda não entendia em um piscar de olhos e outro
porque ainda o via. Porque ainda o sentia, se ele não estava ali. Se ele nunca
quis de fato estar ali.
A presença indesejada de suas
emoções a deixava opaca escutava os gritos dos vizinhos que reclamavam da fumaça
da fogueira que fizera próximo num terreno baldio. E aquela fumaça, bem que
poderia vir até aqui realmente, poderia me incomodar um pouco. Não tenho tempo
para lustrar meus móveis empoeirados e também eu não poderia apanhar a roupa do
varal com sua chegada, dessa forma a roupa ficaria impregnada com o cheiro da
fumaça, mesmo longe mesmo aos poucos ela iria me deixar um pouco dela. Mas eu
também não caberia na fumaça, a fumaça não caberia em mim. Queria poder tocá-lo.
Queria poder apenas uma vez tocá-lo. E assim sendo fumaça o faria ficar
impregnado de mim e ainda que quisesse não perderia meu cheiro assim que eu
virasse e eu estaria lá e estaria aqui. Sentada aqui, olhando as mesmas coisas,
pensando mais uma vez, nos meus jarros quebrados. Deixo de ser flor.
E me torno mais uma vez a
semente que precisar nascer, precisar empurrar-se ao mundo, num esforço
continuo e detalhado, em dias e dias que segue num escuro abafado. Escutando,
apenas escutando os sons que vem do alto, mas sem poder vê-los. Sentia o saciar
de sua sede quando água vinha calmamente, mas não sentia a gota do orvalho, então
entre um impulso e outro se esforçava para sair daquele lugar, para enxergar a
luz da manhã, para dormir sobre as estrelas e assim tão pequena e tão frágil
agigantava-se para sobreviver. E aos poucos num estado lento e continuo renascia,
brotava de si para si. Mas e a ciranda?
“Como se minhas mãos não alcançassem,
nunca completei a ciranda. Nunca fiz a volta. Como pedras desenhadas em jardins,
eram meus companheiros da ciranda. Não tinham mãos, não tinham laços, não tinham.”
Eu não sou tão fria. Sempre
abri as mãos. No fundo não queria guerra.
Não tenho armas, só tenho sentimentos. E pra que armas eu só quero amor.
... Mas, o que mais ainda poderia ser?
O que mais ainda? Depois de tudo,
do tudo que eu entreguei.
Não quero perder-me em sentimentos,
mas não consigo chegar ao fim.
Não consigo ainda enxergar o
fim. Mas o final será novamente o começo.
___ Lene Dantas
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